quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O primeiro dia de uma foca na redação

Imagem: EREPUBLIC

Aí, mãe, meu chefe pediu pra esperar, pra ver se rolava alguma coisa. E nada. A tarde toda.
Aí ele: pintou um caso de polícia. Gosta de matéria com sangue?
Aí eu: adoro matéria com sangue.
Aí ele: liga pro delegado nesse número. Doutor Junqueira.
Aí eu: ligo, sim, ligo agora.
Aí ele: parece que foi briga de bar, um morto, esfaqueado, checa lá. 15 linhas, ok?
Aí eu peguei o telefone, aí o doutor não tava na sala, aí eu liguei de novo, aí eu falei com o bendito doutor, aí eu anotei tudo rapidinho, aí eu não entendi minha letra, aí eu comecei a suar frio, aí eu escrevi correndo.
Aí ele: solta o texto, Luísa.
Aí eu: tô soltando.
Aí ele: solta o texto, Luísa.
Aí eu: já soltei.
Aí ele ficou lendo e franziu a testa e coçou a orelha com o dedinho.
Aí eu fiquei rezando pro texto estar bom, porque eu escrevi correndo, lembra, mãe?
Aí ele não parava de ler, meu Deus!
Aí eu já pensando que tava uma droga, porque como pode demorar tanto pra ler um texto de 15 linhas? E digitou umas coisas e outras coisas.
Aí ele: Luísa, vem cá.
Aí eu: tô indo (com as pernas bambas, sabe, mãe?).
Aí ele: teu texto tá ótimo.
Aí eu: nossa, obrigada!
Aí ele: tinha um errinho só, muitas aspas, viu?, mas depois a gente conversa.
Aí eu: ah, claro, muitas aspas.
Aí ele: como você quer assinar a matéria?
Aí eu: com meu nome.
Aí ele: isso eu sei. E qual o teu nome completo?
Aí eu: Ana Luísa Fonseca de Barros Oliveira Medeiros.
Aí ele: caramba, tudo isso?
Aí eu: tudo isso.
Aí ele: muito grande. Corta pruns três nomes.
Aí eu: gosto de Luísa Medeiros.
Aí ele: Luísa com “z”?
Aí eu: com “s” e acento.
Aí ele: pode chegar cedo amanhã?
Aí eu: na hora que você quiser.
Aí ele: gosta de pauta na rua?
Aí eu: adoro pauta na rua.
Aí ele: às 7 horas aqui (e coçou a orelha de novo com o dedinho).
Aí, mãe, foi isso. Primeira matéria assinada! Página 3, meio lá embaixo, sabe? E, ó, não esquece de comprar o jornal amanhã, tá?
Fonte: Desilusões Perdidas

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